ELEMENTOS DA RESENHA
ALVES-MAZZOTTI, Alda J.; GEWANDSZNAJDER, Fernando. O método nas ciências naturais e sociais: pesquisa quantitativa e qualitativa. 2. ed. São Paulo, Pioneira, 1999. 203 p.
1 CREDENCIAIS DOS AUTORES
Alda Judith Alves Mazzotti é bacharel
licenciada em Pedagogia, bacharel em Psicologia, Psicóloga, mestre em Educação,
doutora em Psicologia da Educação, professora titular de Psicologia da
Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro e
leciona a disciplina de Metodologia da Pesquisa em cursos de graduação e
pós-graduação desde 1975. Outras obras:
ALVES-MAZZOTTI, Alda J., (1994). Do trabalho à rua: uma análise das representações sociais produzidas por meninos trabalhadores e meninos de rua. In Tecendo Saberes. Rio de Janeiro: Diadorim-UFRJ / CFCH. _________ . (1996). Social representations of street children, resumo publicado nos Anais da Terceira Conferência Internacional sobre Representações Sociais, realizada em Aix-em- Provence. Fernando Gewandsznajder é licenciado em Biologia, mestre em Educação, mestre em Filosofia e doutor em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Outras obras: GEWANDSZNAJDER, Fernando. O que é o método científico. São Paulo: Pioneira,1989. _________. A aprendizagem por mudança conceitual: uma crítica ao modelo PSHG. Doutoramento em Educação. Faculdade de Educação da UFRJ, 1995. 2 RESUMO DA OBRA
O livro é constituído de duas partes,
cada uma delas sob a responsabilidade de um autor, traduzindo sua experiência
e fundamentação sobre o método científico, em abordagens que se complementam.
Na primeira parte, GEWANDSZNAJDER
discute, em quatro capítulos, o método nas ciências naturais, apresentando
conceitos básicos como o da lei, teoria e teste controlado.
No capitulo inicial há uma visão geral do método nas ciências naturais e um alerta sobre a não concordância completa entre filósofos da ciência sobre as características do método científico. Muitos concordam que há um método para testar criticamente e selecionar as melhores hipóteses e teorias. Neste sentido diz-se que há um método cientifico, em que a observação, a coleta dos dados e as experiências são feitas conforme interesses, expectativas ou idéias preconcebidas, e não com neutralidade. São formuladas teorias que devem ser encaradas como explicações parciais, hipotéticas e provisórias da realidade. O segundo capítulo trata dos pressupostos filosóficos do método científico, destacando as características do positivismo lógico, segundo o qual o conhecimento factual ou empírico deve ser obtido a partir da observação, pelo método indutivo, bem como as críticas aos positivistas, cujo objetivo central era justificar ou legitimar o conhecimento científico, estabelecendo seus fundamentos lógicos e empíricos. A partir das críticas à indução, o filósofo Karl Popper (1902- 1994) construiu o racionalismo crítico, sua visão do método cientifico e do conhecimento em geral, dizendo que ambos progridem através de conjecturas e refutações, sendo que a tentativa de refutação conta com o apoio da lógica dedutiva, que passa a ser um instrumento de crítica. Apoiados em sua visão da história da ciência, Thomas Kuhn ( 1922- 1996) , Lakatos e Feyerabend, entre outros, criticam tanto Popper quanto os indutivistas, alegando que sempre é possível fazer alterações nas hipóteses e teorias auxiliares quando uma previsão não se realiza.
Kuhn destaca o conceito de paradigma
como uma espécie de “teoria ampliada”, formada por leis, conceitos modelos,
analogias, valores, regras para a avaliação de teorias e formulação de
problemas, princípios metafísicos e “exemplares”. Tais paradigmas orientam a
pesquisa cientifica; sua força seria tanta que determinaria até mesmo como um
fenômeno é percebido pelos cientistas, o que explica por que as revoluções
cientificas são raras: em vez de abandonar teorias refutadas, os cientistas
se ocupam com a pesquisa cientifica orientada por um paradigma e baseada em
um consenso entre especialistas.
Nos períodos chamados de “Revoluções Cientificas”, ocorre uma mudança de paradigma; novos fenômenos são descobertos, conhecimentos antigos são abandonados e há uma mudança radical na prática cientifica e na “visão de mundo” do cientista. A partir do final dos anos sessenta, a Escola de Edimburgo, defende que a avaliação das teorias cientificas e seu próprio conteúdo são determinados por fatores sociais. Assume as principais teses da nova Filosofia da Ciência e conclui que o resultado da pesquisa seria menos uma descrição da natureza do que uma construção social. O terceiro capítulo busca estimular uma reflexão crítica sobre a natureza dos procedimentos utilizados na pesquisa cientifica. Destaca que a percepção de um problema deflagra o raciocínio e a pesquisa, levando-nos a formular hipóteses e a realizar observações. Importantes descobertas não foram totalmente casuais, nem os cientistas realizavam observações passivas, mas mobilizavam-se à procura de algo, criando hipóteses ousadas e pertinentes, o que aproxima a atividade cientifica de uma obra de arte. Visando apreender o real, selecionamos aspectos da realidade e construímos um modelo do objeto a ser estudado. Mas isto não basta: há que se enunciar leis que descrevam seu comportamento. O conjunto formado pela reunião do modelo com as leis e as hipóteses constitui a teoria cientifica.
A partir do modelo, que representa uma
imagem simplificada dos fatos, pode-se corrigir uma lei, enunciando outra
mais geral, como ocorreu com Lavoisier, que estabeleceu os alicerces da
química moderna.
No quarto capitulo,
GEWANDSZNAJDER conclui a primeira parte da obra, comparando a ciência a
outras formas de conhecimento, mostrando que tal distinção nem sempre é
nítida e, que aquilo que atualmente não pertence à ciência, poderá pertencer
no futuro.
Apresenta críticas a áreas cujos conhecimentos não são aceitos por toda a comunidade cientifica, como: paranormalidade, ufologia, criacionismo, homeopatia, astrologia. Na maioria das vezes, o senso comum, formado pelo conjunto de crenças e opiniões, limita-se a tentar resolver problemas de ordem prática.
Assim, enquanto determinado conhecimento
funcionar bem, dentro das finalidades para as quais foi criado, continuará
sendo usado. Já o conhecimento cientifico procura sistematicamente criticar
uma hipótese, mesmo que ela resolva satisfatoriamente os problemas para os
quais foi concebida. Em ciência procura-se aplicar uma hipótese para resolver
novos problemas, ampliando seu campo de ação para além dos limites de
objetivos práticos e problemas cotidianos.
Na segunda parte do livro,
Alves-Mazzotti discute a questão do método nas ciências sociais, com ênfase
nas metodologias qualitativas, analisando seus fundamentos. Coloca que não há
um modelo único para se construir conhecimentos confiáveis, e sim modelos
adequados ou inadequados ao que se pretende investigar e que as ciências
sociais vêm desenvolvendo modelos próprios de investigação, além de propor
critérios para orientar o desenvolvimento da pesquisa, avaliar o rigor dos
procedimentos e a confiabilidade das conclusões que não prescindem de
evidências e argumentação sólida.
O capítulo cinco analisa as
raízes da crise dos paradigmas, situando historicamente a discussão sobre a
cientificidade das ciências sociais. Enfatiza fatos que contribuíram para
estremecer a crença na ciência, como os questionamentos de Kuhn, nos anos
sessenta, sobre a objetividade e a racionalidade da ciência e a retomada das
críticas da Escola de Frankfurt, referentes aos aspectos ideológicos da
atitude cientifica dominante.
Mostra que os argumentos de Kuhn,
relativos à impossibilidade de avaliação objetiva de teorias cientificas,
provocaram reações opostas, a saber: tomados às ultimas conseqüências,
levaram ao relativismo, representado pelo “vale tudo” de Feyerabend e pelo
construtivismo social da Sociologia do Conhecimento. De outro lado, tais
argumentos foram criticados à exaustão, visando indicar seus exageros e
afirmando a possibilidade de uma ciência que procure a objetividade, sem confundi-la
com certeza.
E ainda, diversos cientistas sociais,
mobilizados pelas críticas à ciência tradicional feitas pela Escola de
Frankfurt, partindo de outra perspectiva, procuravam caminhos para a
efetivação de uma ciência mais compromissada com a transformação social.
Em tal contexto, adquirem destaque nas
ciências sociais, os modelos alternativos ao positivismo, como a teoria
crítica, expondo o conflito entre o positivismo e a visão dialética. Esgotado
o paradigma positivista, adquire destaque, na década de setenta, o paradigma
qualitativo, abrindo espaço para a invenção e o estudo de problemas que não
caberiam nos rígidos limites do paradigma anterior.
A discussão contemporânea propõe
compromisso com princípios básicos do método cientifico, como clareza,
consenso, linguagem formalizada, capacidade de previsão, conjunto de
conhecimentos que sirvam de guia para a ação(modelos).
A análise das posições indica flexibilização dos critérios de cientificidade, preocupação com clareza do discurso cientifico permitindo crítica fundamentada, explicação e não apenas descrição dos fenômenos.
O capítulo seis apresenta
aspectos relativos ao debate sobre o paradigma qualitativo na década de
oitenta.
Inicialmente, caracteriza a abordagem
qualitativa por oposição ao positivismo, visto muitas vezes de maneira
ingênua.
Wolcott denuncia a confusão na área,
Lincoln e Guba denominam o novo paradigma de construtivista e Patton capta o
que há de mais geral entre as modalidades incluídas nessa abordagem,
indicando que seguem a tradição compreensiva ou interpretativa.
Na Conferência dos Paradigmas
Alternativos, em 1989, são apresentados como sucessores do positivismo:
Construtivismo
Social, influenciado pelo relativismo e pela fenomenologia, enfatizando a
intencionalidade dos atos humanos e privilegiando as percepções. Considera
que a adoção de teorias a priori na pesquisa turva a visão do
observado.
Pós
– positivismo - Defende a adoção do método científico nas ciências
sociais, preferindo modelos experimentais com teste de
hipóteses, tendo como objetivo último a formulação de teorias
explicativas de relações causais..
Teoria
Crítica, onde o termo assume, pelo menos, dois sentidos distintos: (1)Análise
rigorosa da argumentação e do método; (2)Ênfase na análise das
condições de regulação social, desigualdade e poder.
Os teóricos – críticos enfatizam o papel
da ciência na transformação da sociedade, embora a forma de envolvimento do
cientista nesse processo de transformação seja objeto de debate. Ao contrário
dos construtivistas e dos pós-positivistas, questionam a dicotomia
objetivo/subjetivo, implicando oposições, declarando que esta é
uma simplificação que, em vez de esclarecer confunde. Para eles
subjetividade não é algo a ser expurgado da pesquisa, mas que precisa ser
admitido e compreendido como parte da construção dos significados inerente às
relações sociais que se estabelecem no campo pesquisado. Tem que ser
entendida como sendo determinada por múltiplas relações de poder e
interesses de classe, raça gênero, idade e orientação sexual. Conceito que
deve ser discutido em relação à consciência e às relações de poder que
envolvem tanto o pesquisador como os pesquisados.
Como organizador da citada conferência, Guba retratou as ambigüidades, confusões e discordâncias existentes, visando estimular a continuação das discussões. A diferença entre as três posições reside na ênfase atribuída e, especialmente, nas conseqüências derivadas dessas questões:o papel da teoria, dos valores e a subdeterminação da teoria. Na prática, observa-se com freqüência a coexistência de características atribuídas a diferentes paradigmas.
No capítulo sete estuda-se o
planejamento de pesquisas qualitativas, discutem-se alternativas e sugestões,
acompanhadas de exemplos que auxiliam o planejamento e desenvolvimento de
pesquisas.
Ao contrário das quantitativas, as
investigações qualitativas não admitem regras precisas, aplicáveis a uma
infinidade de casos, por sua diversidade e flexibilidade. Diferem também
quanto aos aspectos que podem ser definidos no projeto. Enquanto os
pós-positivistas trabalham com projetos bem detalhados, os construtivistas
sociais defendem um mínimo de estruturação prévia, definindo os aspectos
referentes à pesquisa, no decorrer do processo de investigação.
Para a autora, um projeto de pesquisa
consiste basicamente em um plano para uma investigação sistemática que busca
uma compreensão mais elaborada de determinado problema.
Seja qual for o paradigma em que está operando, o projeto deve indicar: o que se pretende investigar; como se planejou conduzir a investigação; porque o estudo é relevante. Encerrando a obra, o capítulo oito trata da revisão da bibliografia, destacando dois aspectos pertinentes à pesquisa: (1) análise de pesquisas anteriores sobre o mesmo tema e ou sobre temas correlatos; (2) discussão do referencial teórico.
Sendo a produção do conhecimento uma
construção coletiva da comunidade científica, o pesquisador formulará um
problema, situando-se e analisando criticamente o estado atual do
conhecimento em sua área de interesse, comparando e criticando abordagens
teórico-metodológicas e avaliando o peso e confiabilidade de resultados de
pesquisas, identificando pontos de consensos, controvérsias, regiões de
sombra e lacunas que merecem ser esclarecidas. Posicionar-se-á quanto ao
referencial teórico a ser utilizado e seguirá o plano estabelecido.
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